domingo, 6 de fevereiro de 2011

Estar em Machanga é uma bênção

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Primeira semana em Machanga. As meninas aos poucos estão chegando e o lar logo estará cheio. Cheio de vida, risadas, barulho, enfim, cheio de jovens mulheres.

Já vejo alguns rostos novos, nem todas estavam aqui o ano passado. Fico feliz por mais meninas fazerem parte do lar e triste em saber que algumas não voltarão. Duas se casaram, a mais nova, 14 anos. Morre ali a oportunidade de serem educadas, de terem acesso a informação e conhecimento. Uma pena.

Bom, o clima é muito quente e úmido e na primeira noite não agüentei dormir no quarto. No meio da noite coloquei minha esteira lá fora e foi lá que consegui algumas poucas horas de sono até que a chuva veio e me obrigou a entrar. Ao terceiro dia as chuvas começaram a acontecer durante a noite o que aliviou um pouco o calor. As chuvas são pesadas e os quartos ficam cheios de água. Mas ainda assim prefiro que elas venham para refrescar o forno que é debaixo das telhas de metal.

Com as chuvas os campos e as arvores estão carregadas. Osabacaxis são muito doces, as mangas abundantes, oscoqueiros repletos, minha amoreira está até curva de tantas amoras. Faço a festa. Já estou até enjoada de mangas. Um jovem que estou ajudando com patrocínio para voltar a escola veio até o centro pegar uma ajuda em dinheiro para a família, subiu nos coqueiros e tirou cerca de trinta cocos. Foi tão rápido que me surpreendi com o talento do jovem em escalar. Mês que vem vai me trazer um bode de presente.

Acordamos bem cedo e outro dia levantei com as tias e um vizinho tentando com a ajuda dos cães matarem um macaco que tentou entrar na capoeira para pegar sei lá, uma galinha, um pato, ovos. Coitado, não matou a fome, porém fez o café da manhã dos cachorros.

Levanto tão cedo que a manhã parece não ter fim. Varro o quarto cerca de 7 vezes ao dia, tomo aproximadamente 4 banhos diários e ainda assim parece que o calor e o pó e a lama não tem fim.

Para incentivar o inicio do ano letivo, trouxe canetas, lápis e apontadores para as meninas. Uma pequena ajuda que traz sorrisos e entusiasmo.

Assim que cheguei pintei meu quarto. As paredes estavam muito feias e a tinta trouxe nova vida ao ambiente. Também foi uma forma de servir como exemplo e mostrar que nós, meninas, podemos fazer tais ajustes sem depender de profissionais que não podemos pagar. O quarto ficou bonito, colorido de verde e azul. Já disse a elas que se quiserem um quarto bonito também, posso providenciar a tinta se elas se propuserem a trabalhar como pintoras. Já consegui a empolgação de um quarto. Ainda tenho uma lata de tinta rosa. Caso os outros quartos se interessem tenho que lutar para comprar mais umas latas. Mas com certeza valerá a pena.

Este ano quero aproximá-las mais de Deus e teremos devocionais todos os dias. Deus tem me mostrado que não só as meninas precisam dessa aproximação, o guarda e as tias que aqui trabalham também. O guarda está sempre pronto a ouvir e aprender mais sobre a Palavra. Glória a Deus por isto. Orem para que Deus me capacite em fazer a Sua Obra e que o Espírito me guie ao compartilhar a minha fé.

Leio muitos livros e eles me ajudam muito a passar o tempo, a entender melhor a história moçambicana e edificar minha fé. Leio de tudo um pouco. Quanto a língua, parece que não irei muito além do que já aprendi, mas tudo bem, vale a pena continuar tentando, principalmente quando os vizinhos se empenham tanto em me ensinar.

Falando nisso, apesar de português ser a língua oficial, não é novidade que muitos sabem bem pouco. Entretanto, todos sabem muito bem umas certas frases que me deixam maluca. Tais como, “Como você voltou gorda!”, “Priscila, você engordou demais!”, e assim vai... Já comecei minha dieta mesmo com algumas pessoas objetivando.

Também voltei a ser “muzungo” (branco). Na África do Sul com tantos brancos europeus eu era considerada colorida. Lá existem “black”, “white” e “colored”, ou seja, negros, brancos e os “colored” misturados ou coloridos ou “de cor”. Cores... bahhhhh =/ . Como se a cor da pele importasse de alguma forma.

Sinto muitas saudades da minha família e alguns dias são mais que outros, mas estou quase no meio. Cinco meses já se passaram e sete mais por vir. Que o Eterno me dê sabedoria para transformar este novo ano em um ano repleto de Deus aqui no Lar para meninas, “American Board”.

14/01/2011

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Domingo, dia de ir a igreja. Igreja que fica debaixo de uma mangueira onde o pastor é bem velhinho e as senhoras sentam-se em esteiras. O culto foi agradável, com sermão sobre Zaquel. Claro que foi em Ndau e eu não entendi muita coisa mas para mim o importante é saber que a vida espiritual da comunidade tem sido suprida, ainda que com muito poucos membros e de forma bem simples. Domingo é também dia de conviver.

É muito bom ver as meninas correrem e brincarem e rirem e trançarem. O dia estava quente e debaixo do sol era impossível jogar futebol. Enchi um balão com água e jogamos até que ele estourou em uma das meninas deixando a molhada e garantindo a gargalhada de todas as outras. Ainda não estávamos satisfeitas e fomos ao rio para ver como estava. Devido as chuvas a área fica alagada e sabíamos que era bem provável termos que voltar antes de chegar ao rio. Sim tivemos que voltar mas é claro que fomos o mais longe possível com direito a passagem por poças de lama até o joelho. Atividade bem comum esta época do ano. Enfim fizemos nossa caminhada de volta. Como é bom ser feliz e ter toda a energia de correr, pular, cantar, brincar. Estar em Machanga é uma benção.

O céu é sempre lindo e sempre me faz lembrar da excelência da criação e do Salmo 19:1. “Os céus proclamam a glória de Deus, e o firmamento anuncia as obras das suas mãos.” Os animais são cheios de cor e acredito nunca ter visto tanta variedade de pássaros e insetos como aqui. Há passarinhos bem amarelos e vermelhos e azuis brilhantes, libélulas de todas as cores e uma das mais bonitas é vermelha e roxa. Há grilos multicoloridos e sapos e lagartos de todos os tamanhos. Já não me incomodo nem com as aranhas, só quando são maiores que a palma da minha mão, mas se não, deixo as a vontade, afinal elas comem os mosquitos e pensando assim podem me salvar de malária. Rsrsrsrs

É claro que sinto falta de casa e da igreja e de São Paulo, entretanto poder compartilhar com estas moças o privilégio de estudar é minha maior motivação. O conhecimento pode mudar o mundo ainda que o mundo delas seja não mais que uma vila chamada Machanga.

Orem para que Deus me dê sabedoria para compartilhar a Palavra. Elas sabem muito pouco ou quase nada sobre Deus, Jesus, a Bíblia. Quando voltei perguntei sobre o Natal, falei um pouco sobre o amor e fiz perguntas. O natal por aqui nada mais é do que : “o dia da família”, nada relacionado com o nascimento do Messias e a Bíblia é um livros de histórias que muitos não tem acesso. Triste realidade onde a religiosidade está em temer feiticeiros e acreditar que tudo ao redor está relacionado com o desejo e feitos deles.

Não vim como missionária e muitas vezes não me sinto capaz ou preparada a fazê-las entender a Verdade. A Palavra de Deus diz que “Todo aquele que invocar o nome do Senhor será salvo. Como, porém invocarão aquele em quem não creram? E como crerão naquele de quem nada ouvirão? E como ouvirão se não há quem pregue?” (Romanos 10:13-14)

Que o Senhor prepare trabalhadores para a seara. Eu oro também para que ainda que de forma sutil eu possa semear algo em seus corações também.

Graça e paz para todos,

Priscila Santana (24/01/2011)

Priscila é membro da Igreja Evangélica Menonita de Interlagos em São Paulo e está em Moçambique no Programa da Rede de intercâmbios de jovens Anabatistas Menonitas do MCC Comitê Central Menonita e está servindo em Machanga, na Província de Sofala.

Se quiser escrever pra ela: priscilinha_sant@hotmail.com

















 
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